Ladrões de Bicicletas

01/09/2011

Ladrões de Bicicletas é um daqueles filmes que poderíamos colocar na gaveta dos filmes tristes. E que isso não diminua seu interesse por ele, e nem limite a variedade de leituras que podemos fazer do mesmo. Afinal, o filme não é só triste. E não nos cabe rotular…

Com muita sutileza, cenas extremamente delicadas, acrescente a isso uma trilha sonora melancólica e pronto!  A tristeza vai contagiando a todos, mas não se preocupe, isso não é nem de longe ruim. Não tem como não se comover. É como a tristeza do dia-a-dia, das notícias dos jornais, da realidade, por vezes, da nossa própria vida.

O filme faz parte do movimento neorrealista do cinema italiano, e é dirigido pelo premiado Vittorio De Sica. É um documento. E pelo contexto no qual estava inserido, na Itália pós-guerra, o longa acaba sendo o retrato de uma sociedade destruída e carente de todos os bens essenciais para viver.

Apesar de tudo isso, o filme começa bem e esperançoso.

O pai, Antonio Ricci, que está desempregado há uns três anos, consegue logo no início da trama um emprego: colar cartazes de cinema. Entretanto, a condição era que o contratado possuísse uma bicicleta para assim, facilitar as tarefas por toda a cidade. O veículo existia de fato, mas estava penhorado, assim como infinitos bens dos italianos, em busca de um pouco de dinheiro no final da década de 40. A necessidade é o que move o filme. Penhorando outros bens, a família de Ricci consegue recuperar a “tal” bicicleta. O futuro era promissor.

No primeiro dia de trabalho de Antonio Ricci, a bicicleta é roubada. E a partir daí a trama ganha outro ritmo. Em busca da bicicleta, a esperança da família, Ricci, acompanhado por seu carismático filho Bruno, segue por toda a cidade em busca da esperança perdida, ou melhor, da bicicleta.

São do pequeno Bruno algumas das cenas mais tocantes do filme, na maioria das vezes sem falas. Com uma expressão facial, uma corridinha, ou com o casaco cobrindo a cabeça na chuva, Bruno nunca reclamou, nem de fome, nem de cansaço: ele é o fiel escudeiro de seu pai. E no final, com os olhos cheios de lágrimas enquanto limpava o chapéu do pai, Bruno ganha o filme.

Se Ricci encontra ou não a bicicleta, se a situação melhora para a família, você vai descobrir. O fato é que a relação com a vida real é inegável. A bicicleta é uma metáfora, é aquilo que nos move diariamente. É a esperança de que sempre, sempre algo bom vai nos acontecer. E o grande mistério é por que às vezes acontece, e às vezes não…?

Ladri di Biciclette é um documento histórico. É um filme cruel por mostrar uma realidade tão bruta, é um filme doce pelas bolas de sabão que passam despercebidas, é um filme sobre esperança numa situação extrema, mas, sobretudo é um filme que fala sobre o que o homem é capaz de fazer…

*Ivana Lemos escreveu este texto. Trata-se do programa distribuído durante exibição de “Ladrões de Bicicleta”, no dia 30 de agosto de 2011.


Hoje tem Ladrões de Bicicleta

30/08/2011

O Terça tem cinema retoma as exibições de 2011 neste segundo semestre com o filme Ladrões de Bicicleta.

Dia: 30 de agosto
Hora: 18h30
Local: miniauditório do Campus Curitiba da UTFPR

Confira ficha técnica.

Ficha técnica

Título original: Ladri di Biciclette
Gênero
: Drama
Duração
: 90 min
Ano de lançamento
: 1948
País
: Itália
Estúdio
: Produzioni De Sica
Distribuidora
: Ente Nazionale Industrie Cinematografiche
Direção
: Vittorio De Sica
Roteiro
: Cesare Zavattini, baseado em estória de Oreste Biancoli, Suso Cecchi d’Amico, Vittorio De Sica, Adolfo Franci, Gerardo Guerrieri e Cesare Zavattini e em romance de Luigi Bartolini
Produção
: Giuseppe Amato e Vittorio De Sica
Música
: Alessandro Cicognini
Fotografia
: Carlo Montuori
Edição: Eraldo da Roma
Elenco: Lamberto Maggiorani (Antonio Ricci), Gino Saltamerenda (Baiocco), Enzo Staiola (Bruno), Lianella Carell (Maria), Vittorio Antonucci (Ladrão).

Sinopse
Em Roma um trabalhador de origem humilde, Antonio Ricci (Lamberto Maggiorani), é razoavelmente feliz e trabalha para sustentar a família. Precisando ter uma bicicleta para pegar um emprego, com sacrifício ele consegue recuperar a sua bicicleta, que estava empenhada. Entretanto ela é roubada, para seu desespero. Juntamente com seu filho Bruno (Enzo Staiola), Antonio a procura pela cidade. Como não consegue encontrá-la, ele resolve cometer o mesmo crime.


Conheça um dos principais representantes do Neo Realismo Italiano da década de 40

17/08/2011

Ladrões de Bicicleta é um dos filmes integrantes do Neo-Realismo, movimento originário na Itália no meio dos anos 40 que contava histórias de conseqüências da guerra, ou então resistências durante a mesma; movimento que possui alguns dos melhores filmes da história do cinema. Além do filme em questão, Roma, Cidade Aberta (de Roberto Rossellini, com roteiro do gênio Federico Fellini), Obsessão e A Terra Treme (ambos de Luchino Visconti) são outros clássicos inesquecíveis presentes no movimento. Quem dirige Ladrões de Bicicleta é Vittorio de Sica, o mesmo por trás das lentes de Milagre em Milão e O Teto, o poeta do Neo-Realismo, o sentimental do triângulo básico neo-realista. Era o homem das emoções, o que ia direto aos corações italianos.

Vale citar que, por causa do medo da imagem que a Itália tinha com o que os filmes mostram, os neo-realistas sofriam diversas repressões, o que levou todos os diretores a abandonar esse estilo de filmar pouco depois. Diversas pessoas são mostradas desesperadas, atrás de emprego, fazendo qualquer coisa. Mostra-se também o mercado negro, representado pelo mercado de bicicletas, e o desespero humano, até onde uma pessoa pode chegar. Aliás, é nisso que o filme se baseia, na degradação humana pela necessidade, em busca do que hoje para muitos pode ser banal. O desespero de forma crua e imprevisível, tudo com o toque sentimental inconfundível De Sica à obra.

A história de Ladrões de Bicicleta se passa logo após a segunda grande guerra, com a Itália destruída e o povo passando necessidade. Ricci (interpretado pelo amador Lamberto Maggiorani) consegue um emprego após muita espera. Só que esse emprego (de colar cartazes na rua) lhe pedia como obrigação uma bicicleta, já que ele deveria se locomover muito e andando não seria uma boa opção, por causa do tempo que seria desperdiçado. Sem dinheiro, Ricci e sua mulher Maria (interpretada por Lianella Carell) conseguem dinheiro para uma bicicleta, possibilitando Ricci de realizar o seu trabalho. Na história há também o menino Bruno, interpretado por Enzo Staiola, filho do casal de aparentemente 10 anos, no máximo. Fascinado por bicicletas, o menino cai de cabeça com o pai na busca pela bicicleta que lhe foi roubada, enquanto Ricci trabalhava em seu primeiro dia. Esse roubo é o empurrão para o desenrolar do filme, a busca incansável de Ricci, seu filho e amigos para recuperar o objeto não só de trabalho, mas de esperança de uma vida melhor da família.

A cena em que Ricci consegue sua bicicleta e sai para o primeiro dia de trabalho é antológica. Só de lembrar da música eu me arrepio, a felicidade era completamente expressada na cena, a esperança de um futuro melhor, tudo. E a fotografia tem um papel importantíssimo na obra, além da música. Com o decorrer do filme, ambos vão ficando cada vez mais pessimistas, escuros, fúnebres. O clímax se desfaz com mais uma cena antológica, inesquecível, não há como não sentir pena do personagem.

Outro ponto que queria ressaltar é a utilização de atores amadores na obra. Por causa da falta de verbas (e até mesmo do desemprego que rondava a época), muitos filmes neo-realistas eram rodados com 100% do elenco de atores amadores, como aqui em Ladrões de Bicicleta. Alguns casos à parte, como Roma, Cidade Aberta, faziam uma mistura de amadores com profissionais. De Sica sabia sempre como ninguém guiar seus atores, e este filme é um perfeito exemplo disso. Não há como, em nenhum momento do filme, você afirmar que aquelas pessoas em frente à câmera não são convincentes. Quando era necessário, recursos mais pesados eram usados, como na cena em que Bruno tinha que chorar após apanhar o pai. Enzo não conseguia chorar, então o que fizeram? Colocaram cigarros da produção em seu bolso e começaram a acusá-lo de roubo. Ofendido, o menino começou a chorar de verdade. Cena que De Sica captou com perfeição e adaptou de maneira mais magistral ainda à trama. Ah, outra curiosidade interessante (porém, nada feliz) é que muitas das cenas desse tipo de filme eram rodadas em céu aberto. Isso porque os estúdios italianos estavam todos ocupados com pessoas desabrigadas da guerra.

Ladrões de Bicicleta com certeza é um filme que irá não só lhe entreter, mas também emocionar. Não há como ficar indiferente a esta magnífica obra de De Sica, sentimentalista. Uma triste realidade, mas que é colocada de uma forma toda especial, reflexiva. Quem se considera um cinéfilo de plantão, filme obrigatório para se assistir e ter em sua videoteca caseira.

Crítica escrita por Rodrigo Cunha no Cineplayers