O filme do mês de maio, Dolls (2002), do aclamado ator e diretor japonês Takeshi Kitano, surpreende por trazer um silêncio perturbador e uma beleza avassaladora, caminho oposto ao tomado nos trabalhos anteriores como Hana-Bi (1997) e Brother (2000).
As sequências a seguir tratam de três histórias sobre amor, desilusão, amargura e melancolia. Temas universais que Kitano trabalha com primor e delicadeza, independente do momento histórico ou do lugar, tornando cada historia única, particular.
O início da história mostra a cena de um casal de bonecos do Teatro Bunraku, uma manifestação tradicional da cultura japonesa onde os bonecos não demonstram expressão facial ou emocional. Este inicio traz uma enigmática pista do desenvolvimento dos personagens.
A primeira trama desenvolve-se no rompimento do casal Matsumo (Hidetoshi Nishijima) e Sawako (Miho Kanno), a outra história retrata a obsessão de um homem por uma artista pop e há ainda espaço para o entrelace de um terceiro ato em que um figurão da máfia solitário decide reencontrar um amor do passado. As ações resultam em suicídio, culpa, dependência e dor. Sem dar muitos detalhes, afinal o fator surpresa faz parte, todas as histórias demonstram uma profunda tristeza que não deixa de ser poética e bonita, contestada ou reforçada o tempo todo pela exuberância visual do filme.
Se o tema do Clube para 2013 é “O lugar onde o filme acontece”, Dolls entra com louvor. Neste caso, toda a direção de arte acaba virando uma personagem do filme, essencial para a história e seu entendimento. O contraste entre a expressão quase inexistente do primeiro casal e as paisagens, lugares, figurinos é gritante, toda carga dramática, o grito contido, o choro, o sorriso triste, o amor não correspondido, tudo isso parece estar presente na direção de arte e transborda aos olhos do espectador.
O filme é carregado de beleza e simbologias que enriquecem a leitura, forma tecituras, envolve os personagens. As cores presentes, os bonecos, o fio que une o casal, as estações do ano que marcam a trama, os silêncios constantes formam lacunas ocupadas pela beleza do entorno, dão respiro, tornam o filme uma experiência visual, sensorial, psicológica que fica ecoando mesmo depois de seu fim.
Dolls é uma experiência do belo.
* Texto escrito por Ivana Lemos e Juliana Perrella e distribuído como programa da exibição do filme Dolls