Cinema Paradiso

11/04/2012

O filme Cinema Paradiso revela-se uma sensível homenagem à sétima arte. Esta homenagem fica evidente nas referências aos filmes que aparecem ao longo da história, mas também se mostra na própria vida do personagem Salvatore, o Totó. Um menino pobre, crescendo numa pequena cidade da Itália, sem a presença do pai que, ao que tudo indica, jamais voltará da guerra, consegue agregar magia, aventura, romance, humor ao seu dia-a-dia, graças a sua curiosidade e vivacidade, típicas da idade, que o levam, sempre de novo, ao cinema da cidade.

Mesmo crescendo cercado por repressões das principais instituições da sociedade – a Escola, a Igreja e a família – Totó se mostra uma criança inconformada, burlando regras na escola, indo contra as ordens da mãe, que o proíbe de frequentar o cinema, e achando a maior graça do padre da cidade que censura descaradamente todos os filmes, assistindo um por um e determinando quais cenas devem ser cortadas. Totó vai também contra a autoridade maior dentro do próprio cinema, o projecionista Alfredo, que tenta por todos os meios vetar seu acesso à sala de projeção. Por fim Alfredo rende-se à esperteza de Totó e assim começa uma forte amizade que dura longos anos.

Alfredo faz as vezes de mestre e grande mentor de Totó no que diz respeito aos seus conhecimentos e paixão pelo cinema, ao mesmo tempo em que os dois, em muitos momentos parecem espectadores, quando não diretores, do que bem poderia ser um filme: o dia-a-dia dentro do Cinema Paradiso. De seu ponto de vista privilegiado, Alfredo e Totó acompanham histórias que se passam na plateia, casais se apaixonando, pessoas enriquecendo, velhos turrões que jamais entrarão em acordo, o esquisitão que se realiza cuspindo de cima do balcão… personagens que por si só já renderiam bons filmes.

Salvatore cresce, e protagoniza intensamente seus momentos nos mais variados gêneros: vive e se desilude com seu primeiro grande amor, como num filme de romance; atua heroicamente salvando Alfredo de um incêndio, no melhor estilo de filme de ação; e também vive seu drama ao acompanhar as limitações de Alfredo depois do incêndio e quando segue o conselho do seu velho mestre indo embora sem nunca olhar para trás.

30 anos depois, já estabelecido como um importante cineasta em Roma, Salvatore resolve “olhar para trás” e voltar a Giancaldo, quando recebe um telefonema da mãe, contando que Alfredo faleceu. É quando se depara com todos os personagens de sua infância e com o Cinema Paradiso, tristemente abandonado. Alfredo deixa um pacote para Salvatore. E nessa sua última decisão de diretor, determinando quais cenas ainda deveriam ser incluídas no filme de sua vida, é como se Alfredo estivesse dizendo a Salvatore: “viu, não há do quê se arrepender…”

Aline Schefler escreveu este texto. Trata-se do programa distribuído durante exibição de “Cinema Paradiso”, no dia 10 de abril de 2012.


Cinema Paradiso

09/04/2012

Nesta trama pungente e singela, o italiano Giuseppe Tornatore realiza uma das mais belas declarações de amor ao cinema. O protagonista desta história, já imortalizada na história deste gênero artístico-cultural, é de certa forma um alterego do cineasta, que se identifica profundamente com seu personagem Salvatore di Vita, renomado diretor de cinema que reside em Roma, quando é então surpreendido com a notícia da morte de Alfredo.

Imediatamente o artista se recorda de seu amigo, responsável peloCinema Paradiso, refúgio do garoto então conhecido como Totó. Para lá ele escapava sempre que era possível, e neste templo da criação ele foi iniciado pelo projecionista Alfredo, em meados da década de 40, na paixão e nas técnicas da arte cinematográfica.

Mas não é apenas Totó que é introduzido neste universo fascinante. É fácil para qualquer amante do cinema se identificar com as cenas que Tornatore seleciona em seu filme, tesouros que povoam as telas do Cinema Paradiso e encantam, seduzem, embriagam não só o menino fascinado com as imagens que se sucedem, mas também o público, que também tem ou está formando sua própria memória cinematográfica.

É com extrema habilidade e apurada emotividade que o diretor retrata a passagem do menino da infância triste, povoada pela morte do pai na guerra, para o universo adulto, através do cinema. É de forma poética que ocorre este amadurecimento do protagonista, que tem sua sensibilidade e seu olhar educados pelas imagens.

Depois que o jovem sofre uma profunda desilusão amorosa em seu relacionamento com Elena, filha do banqueiro de sua cidade, Salvatore se muda para Roma. Somente após a morte de Alfredo, trinta anos depois, ele retorna para sua inesquecível terra natal, Giancaldo.

Antes de voltar para sua cidadezinha, o cineasta relembra sua infância, quando ainda era o coroinha da igreja do Padre Adelfio e visitava secretamente o Cinema Paradiso. Seu aprendizado é tão eficaz que ele chega a elaborar suas próprias cenas com uma filmadora rudimentar, antes que o cinema seja incendiado e reerguido por um dos habitantes da cidade, recém-enriquecido; Salvatore se torna então o mais novo projecionista de seu recanto.

O tom melancólico desta produção é acentuado pela escolha de Ennio Morricone para compor a trilha sonora do filme, lançado em 1988. Além do mais, a preciosa cenografia e a sublime direção de arte conferem a esta obra, concebida e dirigida por Tornatore, uma aura inesquecível.

Tornatore capricha também no elenco. Ninguém nunca esquecerá esta dupla, o carismático Philippe Noiret como o mestre Alfredo, ao lado de seu aprendiz, o pequeno Totó, que conquista seu irresistível magnetismo da interpretação atraente de Salvatore Cascio, entre outros intérpretes encantadores que povoam esta poesia imagética.

Texto escrito por Ana Lucia Santana , em Infoescola.