“A Rosa Púrpura…” na visão dos estudantes de Áudio e Vídeo

29/03/2012

Alunos das duas turmas do curso de Técnico em Produção de Áudio e Vídeo do Colégio Estadual do Paraná acompanharam a estreia da edição 2012 do “Terça Tem Cinema”. Na tela, para ser assistido e depois discutido, “A Rosa Púrpura do Cairo”. Confira as principais impressões dos estudantes que participaram da atividade:

QUEBRA DE PARADIGMA
“’A Rosa Púrpura do Cairo’ é um filme metalinguístico, que faz uma abordagem interessante sobre uma mulher que é infeliz com seu marido e procura refúgio no cinema. Na trama, um personagem de um filme percebe que a mulher está pela quinta vez assistindo àquele mesmo filme; ele ‘sai’ da tela e se declara. Os dois fogem. O assunto ganha repercussão e o ator que interpreta o personagem vai à cidade para convencer seu personagem a ‘voltar’ para a tela, para o filme. O ator percebe que não consegue convencer seu personagem e então tenta iludir a mulher. Seu plano é bem sucedido e faz com que ela escolha entre o fictício e o ‘real’. Ela escolhe o ‘real’; o fictício volta para a tela e quando a mulher acredita que terá um final feliz com seu amado descobre na manhã seguinte que ele fingiu e ela terá que voltar para sua vida infeliz. A história é ótima, pois é realista e quebra o paradigma de que filmes devem possuir final feliz.”
Por Ana Carolina Rodrigues

O INESPERADO
“O ponto alto do Terça Tem Cinema está em abrir espaço para que profissionais interajam com o público para expressar suas opiniões sobre o filme exibido. Na primeira sessão foi exibido ‘A Rosa Púrpura do Cairo’, de Woody Allen, filme que fala sobre o sentimento do espectador em relação ao cinema, mostrando uma jovem em uma época de muitas dificuldades do pós-guerra e sem muitas expectativas para futuro. Essa jovem consegue escapar de seus problemas ao frequentar uma sala de cinema. Um belo filme, que nos prende à história até que ela termine – e de uma forma inesperada.”
Por Frances Melo

ENTRE O REAL E O CINEMATOGRÁFICO
“Mulher desempregada e maltratada pelo marido assiste a um filme no cinema e os personagens criam vida – um deles sai da tela do cinema e então se inicia um romance entre a mulher e o personagem. Porém, o ator que criou personagem vai até a cidade para fazer com que esse personagem volte para o mundo cinematográfico. Ocorre que a moça também se apaixona pelo ator e ela fica dividida entre o mundo real e o cinematográfico. Ela escolhe o mundo real, mas percebe que esse mundo real também é uma ficção.”
Por Karina Menezes Pinto Coelho

UM TANTO DE IRONIA
“De uma maneira bem divertida, Woody Allen apresenta em “A Rosa Púrpura do Cairo” o fascínio de uma garçonete pelo cinema e sua fantástica aventura com seu personagem favorito. Com uma pitada de inocência, um bocado de bom humor e um tanto de ironia, retrata uma sociedade sedenta por fantasia como alternativa para sua dura realidade.”
Por Kellyn Bethania

Texto enviado pelo professor Wagner de Alcântara Aragão


A Rosa Púrpura do Cairo

19/03/2012

Ao longo de sua extensa produção, vira e mexe, Woody Allen gostava de brincar com o cinema. Com a ideia de Cinema. Já foi assim com seu filme de estreia, “O Que Há, Tigresa?”, feito à partir da redublabem e remontagem de um filme japonês. Ou, alguns anos depois, com o documentário falso “Zelig”, que exibimos no ano passado aqui no Clube. Ou até mesmo no relativamente recente “Dirigindo no Escuro”, sobre um diretor que fica cego, mas tem que fazer um filme de qualquer jeito. Entre tantos outros.

Mas a verdade é que não só “A Rosa Púrpura do Cairo” é um dos mais belos filmes sobre cinema de Allen, como também é um dos mais belos filmes sobre cinema que qualquer cineasta poderia querer fazer. E olhe que ao longo do ano veremos alguns muito bons passarem pela tela.

Woody é muito esperto em todas as escolhas. Ao situar o filme na época da depressão econômica, ele pôde contrapor uma duríssima realidade com um dos momentos mais escapistas do cinema. O contraste entre a vida de glamour e aventura do personagem Tom Baxter, com a triste realidade de Cecília é que fazem desse filme de Allen tão especial.

Esse embate entre as duas realidades não está ali apenas para gerar as piadas, ainda que excelentes, como a cena clássica de Baxter achando que qualquer carro pode ser ligado ao se colocar as mãos no volante, simplesmente. Allen acaba discutindo a função social do cinema, postulando que, muito mais do que apenas entreter e sublimar, precisa ser feito para colocar ideias em discussão. O que não implica em fazer um filme chato (Terrence Malick e Lars Von Trier, estamos olhando para vocês).

Com a leveza que lhe é peculiar, Woody Allen faz um de seus mais brilhantes trabalhos, ao lado, talvez apenas de “Hanna e Suas Irmãs”, “Annie Hall” e “Match Point”. Refletindo não apenas sobre a lógica do cinema, como sobre o impacto social que esta arte implica.

Não havia melhor escolha para começarmos as exibições do ano em que estamos, nós mesmos, refletindo sobre o cinema.

*Luiz Gustavo Vilela escreveu este texto. Trata-se do programa distribuído durante exibição de “A Rosa Púrpura do Cairo”, no dia 13 de março de 2012.


A Rosa Púrpura do Cairo, de Woody Allen

10/03/2012

A Rosa Púrpura, no entanto apresenta duas vantagens. Fala sobre o cinema e não tem o diretor como protagonista. O motivo é simples; Woody não poderia ser o galã, pois ele não é galã, é feio e desengonçado, a sua voz é irritante e ninguém o suportaria se não fosse tão inteligente e engraçado. Não poderia ser, também, o marido desempregado e violento, pois é uma pessoa gentil e até frágil. Logo, não há lugar para o ator Woody Allen em A Rosa Púrpura. Tanto melhor, pois ganha o filme em roteiro e direção. E podemos apreciar a grande atriz que sempre foi Mia Farrow, na época casada com o diretor, uma maravilhosa Cecília, meiga e delicada, garçonete que paga as contas em casa e que se intoxica com os sonhos dos filmes de Hollywood, na década de trinta.É uma época dura, de recessão econômica, onde as tensões sociais se resolvem nos cinemas, templos dos sonhos da época, onde era vendido o glamour das Vênus platinadas, a beleza dos musicais, a aventura dos safáris na África, em oposição à  realidade do dia-a-dia do desemprego, da fome e da falta de perspectivas. Hollywood vendia, simplesmente, o american-way-of-life, o sonho americano da liberdade e da riqueza para os imigrantes que fugiam da opressão no velho continente, onde, aliás, se preparava uma carnificina monumental, um sacrifício bestial, na segunda grande guerra. No intervalo entre guerras, o público cinematográfico sonhava. E Cecília era o arquétipo do espectador da época. Queria penetrar na tela, viver o mundo do glamour.Mas quem não se encanta com os filmes da época? Quem não gostaria de entrar na tela de um daqueles filmes e viver de sonhos? Em um outro filme sobre a época, Bonnie and Clyde (Por uma rajada de balas – Artur Penn 1967), há uma cena, logo após um assalto, em que Clyde é obrigado a atirar no rosto de uma pessoa; estão num cinema escondidos. Na tela, um filme de Bubsy Berkeley, o mago da coreografia, onde um grupo de dançarinas canta “I want money”. Clyde discute com o comparsa, havia acabado de assassinar alguém. E Bonnie manda-o falar mais baixo, pois está atrapalhando o filme. Bonnie era, também, como Cecília, uma espectadora cheia de sonhos, só que violenta e ambiciosa.

A doce Cecília nunca encontrou um Clyde Barrow, um verdadeiro aventureiro capaz de mudar a sua realidade. Em seu lugar, vê o próprio galã do seu sonho, o jovem aventureiro, Tom Baxter (Jeff Daniels) descer da tela, comovido pela sua presença constante na platéia, para encontrá-la. E a partir desse absurdo, o filme desenvolve várias situações inusitadas, que se resolvem quando o personagem retorna à tela.

Ao fim, vemos Cecília no cinema, assistindo, embevecida, a cena da dança de Fred Astaire e Ginger Rogers, cantando “Heaven, I’m in heaven”, há novo filme em cartaz e podemos continuar sonhando com o céu.

Texto escrito por Jacques Levin, em recanto das letras.